Cabisbaixo, Raul foi empurrado para dentro da viatura, no momento em que o Dr. Santana chegava. Teve tempo apenas de ver o cliente algemado, pela janela do carro que arrancou em disparada. No portão da casa, Noélia e Sofia, petrificadas, não tinham a menor noção do que estava acontecendo. Ouviam a algazarra dos curiosos e as opiniões sobre os possíveis crimes cometidos por Raul. Para elas, nada daquilo fazia sentido, nenhuma daquelas imputações poderia ser verdadeira. Raul era uma pessoa cordata, afável, bom filho, filantropo; jamais cometeria os crimes que o populacho aventava, irresponsavelmente, em especulações levianas.
Lembrou-se de o quanto havia se impressionado com a descoberta sobre hackers. Aquilo o deixara curioso. Desejava ser um anti-hacker, um super-herói da informática. Sonhava construir um sistema perfeito, à prova de fraude; seria isso possível? Passava horas trancado em seu quarto, construindo fórmulas, testando algoritmos, à procura de alguns que fossem impenetráveis, com cem por cento de segurança. Não conseguia. Talvez ali residisse toda a beleza da inteligência humana: a sua perfeição estava em ser imperfeita. Por mais sofisticado e protegido que fosse o programa, por mais intel igente e sagaz que fosse o programador, haveria a possibilidade de outra inteligência encontrar falhas, mesmo que essas falhas, na maioria das vezes, passassem despercebidas.