Não sei o que ele fazia fora dessas datas, mas essas datas colam-me a ele.
Na Feira de Todos os Santos ele levava-me para conhecer os saltimbancos com quem tinha feito amizade e eu ficava deslumbrado com as lantejoulas das raparigas que se dobravam dum modo impossível, nos seus malabarismos.
No Carnaval ele fazia um campino em boneco de tratos, fazia arreios para o Pinóquio, que era o nosso cão, e largava-o pelas ruas do bairro. O Pinóquio saía desembestado e só regressava quando já não tinha fôlego para correr mais. Chegava ao portão da casa com o campino a arrastar a cabeça no chão e já sem pampilho.
Nas férias da Páscoa lá íamos para o Casal da Tomásia. E desde manhã cedo corríamos todas as nascentes a pescar rãs. Quando acabavam as rãs acabavam as férias
Na Quinta-feira da espiga lá saíamos, com o farnel, passar a tarde no campo em família. Era tudo muito comedido, mas eu escapava atrás do Beto porque era aventura pela certa e íamos espreitar as raparigas mais velhas que se esgueiravam da tutela das mães para os seus namoricos.
Ficámos adolescentes. Aí acompanhava-o aos quintalões da FNAT (Federação Nacional da Alegria no Trabalho) onde havia bailes populares. O Ti Santos, que era o pai do Beto, era funcionário de finanças e tinha entrada livre nos salões do Ateneu, mas o Beto gostava era de cheirar o suor do povo e foi com ele que eu me habituei a trocar os salões galantes dos alinhados pela choldraria (era assim que ele chamava) onde o povo se divertia.